12/06/2020
Concílio Ecumênico de Niceia, A.D. 325 (12 de junho)
O Concílio de Niceia (325)
A pergunta fundamental que determina e orienta esse concilio é de tipo trinitário: que significa para os cristãos a Tríade divina? Em resumo, é preciso voltar à disputa entre Ário (256–336), presbítero da Igreja de Alexandria, e seu bispo, Alexandre. A reflexão de ambos se reduz ao pensamento de Orígenes. Ário, todavia, com base no medioplatonismo e num contexto de polêmica anti-sabeliana, radicalizou o subordinacionismo presente no mestre alexandrino. A ideia de que o Filho, por ser gerado, não pode ser coeterno com o Pai revelou-se um dos pontos centrais de seu pensamento. A exclusão da coeternidade caminhava simultaneamente com a afirmação de que o Filho não é gerado pela substância (ousia) do Pai, mas criado antes do tempo e em vista da criação. Para Ário, a consubstancialidade comportaria a divisão da substância divina em duas partes, reduzindo a divindade a categorias físicas. Consequentemente, a filiação divina de Cristo subsiste, não por natureza porém, mas por adoção e por graça. Alexandre, por sua vez, afirma a geração ab aeterno do Filho e, portanto, sua coeternidade com o Pai. Não é, por isso, criatura. Para afastar a objeção ariana de que a geração é semelhante à geração corpórea, o bispo alexandrino esclarecerá que ela se deu de modo inexplicável, sem divisão ou por eflúvio. Segundo Alexandre, a única nota que distingue o Filho do Pai é o fato de ser gerado. Quanto ao mais, o Filho é imagem e marca perfeitíssima dele, reproduzindo em tudo, em relação ao modelo, uma semelhança total. Se, em suas afirmações, Alexandre demonstra não possuir uma linguagem técnica para definir a união do Pai e do Filho, na polêmica com Ário, porém, preserva a condição de Cristo, verdadeiro Filho e verdadeiro Deus.
O conflito doutrinal entre Ário e Alexandre atingiu sobretudo o Oriente, onde as diversas tendências doutrinais foram levadas ao Concílio de Niceia na pessoa de alguns bispos importantes: ao lado de Ário e Alexandre, respectivamente expoentes de um origenismo radical e de um moderado, aparece, como figura intermediária, Eusébio de Cesareia, defensor do conceito teológico, mas também político, de “monarquia”. Ao ressaltá-la, Eusébio acentuará também a subordinação do Filho, sem o excluir, porém — nem a ele nem ao Espírito Santo — , do mundo da Divindade. Outro personagem-chave do Concílio de Niceia é Marcelo de Ancira, defensor resoluto de um monarquianismo econômico com base no qual Deus é uma mônada indivisível e o Logos uma faculdade operativa deste, desprovida de real subsistência. No momento da encarnação, a mônada ter-se-ia dilatado — mas sem distinção de pessoas — em díade e, com o envio do Espírito Santo, em tríade. Trata-se, porém, de uma fase de passagem ligada à economia (criação e redenção) e, ao seu término, a tríade seria reabsorvida na mônada originária.
Em Niceia, Eustáquio de Antioquia defenderá um monarquianismo moderado. Une-o a Marcelo a aversão ao subordinacionismo de Ário e à doutrina das três hipóstases, que lhe parecia uma forma de triteísmo.
Com essas diversas posições doutrinais chegou-se no Concilio de Niceia a uma fórmula de fé na qual se especificava: “Creio no Senhor Jesus Cristo, filho de Deus, único gerado pela essência do Pai, Deus de Deus, luz de luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai”. No Concílio, o termo consubstancial (omoousios) foi imposto sem que fosse estranha a influência de Constantino. O uso que os monarquianistas já faziam dele, bem como a ambiguidade de significados e a conotação materialista que podia assumir, justifica por que, depois de Niceia, foi deixado de lado, inclusive pelos antiarianos. Será recuperado por Atanásio, depois de 355, sobretudo no Ocidente. No Oriente, todavia, as polêmicas sobre esse termo só se abrandarão devido ao papel esclarecedor de Basílio de Cesareia e de Gregório de Nazianzo, que interpretaram ousia (substância) no significado de substância divina comum às três hipóstases. Será o Concílio de Constantinopla de 381 que, recusando toda expressão de subordinacionismo, sancionará o reconhecimento da consubstancialidade também para o Espírito Santo.
Fonte: Luigi Padovese. Introdução à Teologia Patrística. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2004. p. 70–71
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