Breve homilia para o
Dia de São Lourenço escrita pelo Rev.
Heath R. Curtis, coordenador do
Ministério de Mordomia da LCMS, professor na
Wittenberg Academy e pastor na Trinity Lutheran Church (Worden, EUA). A homilia que traduzi foi
publicada originalmente em 2014 no blog do Rev. William Weedon, diretor de culto e capelão do
Centro Internacional da Igreja Luterana - Sínodo Missouri.
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Os donativos de São Lourenço, por Enrico Pollastrini (1817-1876) |
O OFERTANTE ALEGRE
Leituras:
João 12.1-8
"... os pobres estão sempre com vocês, mas a mim vocês nem sempre terão" (v. 8)
2 Coríntios 9
"... Deus ama quem dá com alegria" (v. 7)
Hoje celebramos a festa de São Lourenço de Roma, um diácono do século terceiro. São Lourenço é conhecido especialmente por dois aspectos que são refletidos em nossas leituras de hoje: seu cuidado pelos pobres e seu martírio. E nestes dois aspectos São Lourenço se destaca com alegria, sendo fielmente um ofertante alegre.
O ano era 258, dias sombrios para o Império Romano. O governo estava quebrado e o cristianismo era ilegal – uma bela combinação se você é o prefeito de Roma. O imperador ordenou que todo o clero da Igreja fosse morto e esta tenebrosa execução já estava bem adiantada até 7 de agosto de 258. Mas o prefeito de Roma começou a pensar – o que acontecerá com todas as riquezas da Igreja? Antes de matar todos esses caras, vamos descobrir onde eles as escondem.
Então, o prefeito da cidade de Roma, ordena que Lourenço, o diácono-chefe, venha para um bate-papo. Como diácono, o trabalho de Lourenço era não apenas ajudar no culto dominical, mas especialmente zelar pela propriedade da Igreja, fazer com que os dons do povo fossem usados corretamente e sabiamente: cuidar para que os edifícios da igreja fossem conservados; para que os ministros recebessem seu sustento; para que os artigos de culto como o cálice para a comunhão, as pinturas, os vitrais ou as vestimentas fossem adquiridos e cuidados; para que tudo fosse mantido em bom estado; e que fossem atendidas as pessoas nas famílias da Igreja que realmente necessitavam de cuidados e passavam por necessidades. Este era o trabalho de São Lourenço.
Mas, para o prefeito romano, Lourenço era apenas o cara da chave do cofre.
“Dê-nos todas as riquezas da Igreja!”
Agora, coloque-se no lugar de Lourenço. Todo dia você vê seus amigos sendo presos pelo governo e sendo executados por sua fé. Você tem se ocupado em esconder todas as pessoas que você pode, levando-as para fora da cidade, etc. As mais vis e sórdidas espécies humanas estão perseguindo todas as pessoas que você ama, procurando destruir a santa Igreja de Deus.
E agora, além de tudo isso, exigem que você entregue todas as coisas formosas da igreja - todos os cálices de ouro, as pinturas, as obras de arte, que foram adquiridas com donativos do povo. Estes homens perversos exigem que a Igreja dê a eles o dinheiro que o povo de Deus oferta para o sustento dos ministros da Igreja - os mesmos ministros que eles tinham acabado de matar à espada!
Como você reagiria? Ficaria abatido demais para se levantar? Perderia as estribeiras num discurso furioso? Cairia no choro?
Lourenço não. Ele tem um plano. Um plano maluco, cômico, engraçado. Mesmo em dias sombrios como aquele São Lourenço ainda conseguiu visualizar uma coisa absurda.
“Dê-me três dias, prefeito, e lhe entregarei todos os tesouros da Igreja”.
O prefeito ficou muito satisfeito – que fácil! Visto que ele era um homem covarde, ganancioso, sem fé, pensou que todos os homens fossem iguais a ele. Supôs que Lourenço só queria mais três dias para viver e ficaria feliz em trair a sua Igreja pela chance de viver por mais 72 horas.
Só que não. Lourenço tinha um plano: um plano para cumprir seus deveres como diácono e um plano para pregar a peça mais bizarra neste prefeito romano. Assim, durante três dias Lourenço fez uma extravagante farra de compras ao avesso. Cada cálice de ouro, cada obra de arte, cada cadeira, cada luminária, tudo! – ele vendeu tudo. Esvaziou e encerrou as contas bancárias e, em seguida, encheu o bolso de todos os aleijados, cegos, paralíticos e leprosos que haviam em Roma.
E então, em 10 de agosto, ele pôs em marcha todo o cortejo dos pobres para a frente da porta do prefeito e disse:
“Veja aí! Aqui estão os tesouros da Igreja. Como pode ver, somos ainda mais rico do que o seu imperador!”
Enfurecido, o prefeito ordenou que Lourenço não seria decapitado de forma rápida e inescrupulosa, como o resto do clero da cidade – não, ele seria açoitado e depois assado vivo em uma grelha.
Agora, novamente: se coloque no lugar de Lourenço. Você imploraria por sua vida? Ficaria pálido e vomitaria? Desmaiaria? Lourenço não. Ele é um homem de fé. Ele sabe para onde está indo. Ele conhece o Jesus que nos fala hoje no Evangelho, o Pão da Vida, a Semente que foi semeada para dar muito fruto, o Jesus que morreu e ressuscitou. O Jesus que derramou seu sangue para que pudéssemos ser purificados de nossos pecados – o Jesus que se levantou dentre os mortos, glorioso e eternamente vivo, e que nos promete uma ressurreição igualmente gloriosa.
Por isso, Lourenço não implorou. Ele não desmaiou. Ele levou os açoites sem uma palavra. E então quando o lançaram na grelha ardente ele rangeu os dentes e aguentou o sofrimento, mas depois de um tempo ele não conseguiu se controlar. Abriu a boca e disse aos soldados:
“Rapazes, eu estou pronto deste lado, é melhor me virar mais antes de comer”.
Ah! O Senhor ama quem oferta com alegria – e Lourenço foi sem dúvida um ofertante alegre.
Agora, eu espero que você não tenha o mesmo destino dos mártires – mas você certamente tem a mesma fé deles. Então, como não sermos alegres? Não conhecemos o mesmo Jesus que São Lourenço conhecia? Não sabemos para onde estamos indo? Não sabemos que a morte não é o fim da nossa história? Não sabemos que as coisas deste mundo são nada além de ferramentas usadas para propósitos de Deus? Não sabemos que a única coisa que importa é apegar-se a Jesus e seguir seus mandamentos de amor?
Permitindo o Senhor, sua vida não será em nada semelhante e tão dramática tal como a de São Lourenço. Mas eu espero que ela seja repleta de bastante alegria: a alegria que vem de conhecer Jesus. A alegria que torna possível ser um ofertante alegre.
O que podemos aprender do irônico acontecimento com São Lourenço? Diante de um mundo que é extremamente sério com relação a seus pecados, sua ganância e sua crueldade, podemos aprender com São Lourenço a rir, a ver quão ridículo o mundo é. As pessoas vivem e morrem por essas coisas bobas: por dinheiro, por poder, de luxúria e por fama. Mas nós vivemos e morrer por Jesus Cristo. O contraste é tão grande que não sabemos se rimos ou choramos. São Lourenço fez as duas coisas. E agora suas lágrimas são enxugadas e ele está muito feliz no céu. Onde aquele prefeito ou aqueles soldados estão depende se eles aprenderam ou não algo de São Lourenço – se eles se apegaram à Palavra e também aprenderam a rir deste mundo. Pois humildade, humor, generosidade e coragem, vêm tudo do mesmo lugar: a fé em Jesus.
Em nome de Jesus. Amém.
Rev. Heath R. Curtis