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“John Donne”, (c. 1616), Isaac Oliver (c. 1565-1617) |
John Donne (1572–1631), poeta inglês e também pastor anglicano, escreveu belos poemas, geralmente em meio a grandes lutas, sofrimentos, doenças e luto. Seu estado de espírito contribuiu para para o desenvolvimento de um tom mais piedoso em seus poemas.
Donne escreveu o poema “
Um noturno sobre sobre o Dia de Santa Lúcia, sendo o dia mais curto”, o qual retrata seus sentimentos diante da morte de um ente querido. Acredita-se que tenha sido escrito em 1627, quando morreram
Lucy Russell, Condessa de Bedford e sua segunda filha Lucy Donne. A condessa era madrinha de Lucy Donne. Curiosamente, três anos depois, Donne escreveu seu testamento no dia de Santa Lúcia (ou Santa Luzia), 13 de dezembro.
O dia de Santa Lúcia era descrito como o dia mais curto e a noite mais longa do ano, pois no antigo Calendário Juliano (que vigorou até o séc. XVI) coincidia com o solstício do inverno no hemisfério norte (por volta de 21 de dezembro). É o que podemos notar no poema de Donne transcrito abaixo:
Um noturno sobre o dia de Santa Lúcia, sendo o dia mais curto
Por JOHN DONNE
É a meia-noite do ano, e também a do dia
De Lúcia, que só por escassas sete horas se desmascara,
O Sol se esgotou, e agora os seus frascos
Irradiam chispas de luz, nunca raios constantes;
A seiva do mundo inteiro se esvaiu;
O bálsamo universal a terra hidrópica sugou,
Para onde, como para os pés da cama, a vida se recolhe,
Morta e enterrada; no entanto, tudo isso parece rir,
Comparado a mim, que sou o seu Epitáfio.
Observem-me bem, pois, vocês que serão amantes
No próximo mundo, ou melhor, na próxima Primavera:
Pois sou tudo o que existe de morto,
Em quem o amor forjou nova Alquimia.
Pois sua arte consegue extrair
Uma quintessência até do nada,
De privações aborrecidas e do vazio escasso:
Ele me arruinou e fui recriado
De ausência, escuridão, morte; coisas que não são.
Todos os outros, de todas as coisas, tiram tudo o que é bom,
Vida, alma, forma, espírito, por isso os têm em seu ser;
Eu, por obra do alambique do amor, sou o túmulo
De tudo, o que é nada. Muitas vezes nós dois
Choramos dilúvios de lágrimas, e assim
Afogamos o mundo inteiro, nós dois; muitas vezes
Transformamo-nos em dois Caos, quando mostramos
Interesse por outras coisas; e muitas vezes as ausências
Arrastaram nossas almas, e fizeram de nós duas carcaças.
Mas com a morte dela, (palavra que não lhe faz jus)
Sou, do primeiro nada, o Elixir desenvolvido;
Fosse eu um homem, que é isso que eu sou
Eu precisaria saber: seria capaz de escolher,
Se um animal eu fosse,
Meios e fins; Mesmo plantas, mesmo pedras odeiam
E amam; Tudo, tudo investe alguma propriedade;
Se eu fosse um nada comum, como uma sombra,
Uma luz e um corpo em algum lugar haveriam de estar.
Mas não sou Nada disso; e nem o meu Sol se renovará.
Vocês amantes, pelo bem de quem o sol menor
Entra nessa época na casa da Cabra
Para buscar nova luxúria e dá-la a vocês,
Aproveitem, todos, o seu verão;
Já que ela goza os festejos da sua noite longa,
Que eu me prepare para ela, e que dedique
Essa hora à sua Vigília e a sua Véspera, já que esta
É a meia-noite profunda do ano e do dia.
Tradução:
Sonia Moreira
Comentários (em inglês) sobre o poema.