Por Diac. Betsy Karkan
Talvez esta não seja a sua opinião. Em seus escritos devocionais sobre o Magnificat, Lutero resume cuidadosamente como devemos e como não devemos honrar esta “Muito Bendita Virgem Mãe”. Lutero não quer dar a ela falsos atributos ou devoção idólatra, nem depreciar “o motivo pelo qual ela é uma pessoa singular dentre todo o gênero humano” como a Mãe de Deus. As Confissões Luteranas (Artigo XXI da Confissão de Augsburgo e Apologia) respaldam Lutero ao apresentar um esquema tríplice de como os cristãos podem honrar Maria e todos os outros santos de forma apropriada. Além disso, a forma como os cristãos falam sobre ela reflete o que a Igreja crê sobre a natureza de Cristo e sua posição em relação à criação.
Para aqueles que acreditam que Maria tornou-se merecedora desta honra por seu próprio mérito ou dignidade, Lutero aponta para as próprias palavras de Maria em relação a sua baixeza e a obra de Deus Pai para com sua humilde serva. Lutero afirma que ela não é escolhida porque é “mais rica, bela, jovem e culta, gozando da mais honrosa reputação aos olhos de todo o país. Entre os vizinhos e suas filhas ela foi uma moça comum... sem dúvida, em nada diferente como o faz uma pobre doméstica de hoje” [1]. Ela é chamada de bendita não por causa de seu próprio mérito ou dignidade, mas porque Deus lhe concedeu essa dádiva, fazendo esta poderosa obra dentro dela. Lutero afirma: “Ela não diz que irão falar muito bem dela, elogiar sua virtude, exaltar sua virgindade ou humildade ou, quem sabe, entoar um hino para exaltar seu feito. Pelo contrário, falarão somente do fato de Deus ter posto os olhos nela, e se dirá que ela é bem-aventurada por causa disso. Com isso não se louva a ela, mas a graça de Deus para com ela” [2]. Apesar de admitir que o título “Rainha dos Céus” seja “certo”, Lutero adverte o leitor a não cometer exagero [3]. Ele adverte contra aqueles que tornaram um costume diminuir a sua nulidade e humildade, elevando-a uma posição como a de uma deusa, que possuiria atributos divinos iguais a Cristo e seria digna dessa posição por si própria, menosprezando assim a graça de Deus. Nessa posição exaltada, ela se torna para muitos uma co-redemptrix a quem as pessoas “clamam mais do que a Deus” [4]. Melanchthon concorda: “Ainda que é digníssima das honras mais excelsas, ela não quer, todavia, que a igualemos a Cristo. Quer antes que consideremos e sigamos os exemplos dela” [5].
Em resposta, muitos protestantes vão para o extremo oposto e jogam fora o proverbial bebê com a água do banho, recusando-se a dar qualquer honra a Maria porque isto pode ser visto como idolatria. Isto é um pouco equivocado e parece mais motivado pela autojustificação do que um conflito real com as Escrituras, com as Confissões e até mesmo com os Pais e Mães da Igreja. Isso levou a uma prática imprópria e preocupante entre muitos protestantes e luteranos, não só em relação a Maria e aos santos, mas também em outras áreas da prática cristã. Se alguma coisa simplesmente parece ou soa “muito católico” na devoção pessoal ou no culto corporativo, então isto é descartado como se ambos não possuíssemos as mesmas dádivas que Cristo concedeu a sua Igreja. Ao invés de desfrutar a riqueza que essas coisas contribuíram para o culto e a vida devocional dos cristãos por milênios, muitos optam por dispensá-la, guiados pelo seu próprio sentimento de piedade.
Lutero, no entanto, não tem receio de dar a Maria toda a honra que ela merece. Ele a chama, com entusiasmo, de “muito bendita Mãe de Deus, bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Cristo” e até mesmo de “Rainha dos Céus” [6]. Ele também se maravilha com a sua fé e a humildade, perguntando: “Não percebes quanto é maravilhoso esse coração?” [7] De que ela é uma pessoa singular como Mãe de Deus: “Ninguém pode dizer coisa mais sublime dela e a ela, ainda que tivesse tantas línguas como existem folhas e ervas, estrelas no céu e areia no mar” [8].
Como bom professor, Lutero não usa esses títulos para dar a ela honra sem motivo. Ele sabe que há algo de grande valor a ser aprendido com eles. Como o Artigo XXI da Apologia declara, ao honrar os santos, os cristãos são “ensinados a dar graças a Deus, a estarem fortalecidos na fé e encorajados a imitar a fé e as virtudes deles” [9]. A maneira como falamos de Maria e da obra de Deus nela também é uma confissão daquilo que cremos sobre Cristo e sua obra em nós. Ao dizer que Maria é Mãe de Deus, os cristãos confessam que Cristo é Deus e Homem ao mesmo tempo, duas naturezas unidas em uma só pessoa. Em Maria, vemos que Deus escolheu se colocar dentro do seu ventre e somos lembrados de que Ele também escolhe colocar-se dentro de nós através de sua Palavra e Sacramentos. Além disso, na nulidade e humildade de Maria, vemos a graça do Senhor e a mão misericordiosa para conosco pobres pecadores, como diz São Paulo: “Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes” [10]. Os cristãos são alentados de que, mesmo em nosso estado pobre, desprezado e humilde, Deus escolhe conceder sua graça e favor a nós, como a Maria, ao operar os seus poderosos feitos em nós.
- A diaconisa Betsy Karkan serve na Concordia Univeristy-Chicago, EUA.
[1] Lutero, O Magnificat
[2] Ibid
[3] Ibid
[4] Ibid
[5] Apologia, Artigo XXI:27
[6] Lutero, O Magnificat
[7] Ibid
[8] Ibid
[9] Apologia, Artigo XXI:4
[10] 1 Coríntios 1.27
Artigo publicado originalmente em inglês no portal LutheranReformation.Org
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